Seja em campo ou nos bastidores, no mundo do futebol tem lugar para quem quiser, basta ter talento e paixão pelo esporte. Melhor ainda é quando dá para fazer dessa paixão, um trabalho. A partir de hoje você confere uma série de reportagens sobre os direitos trabalhistas que podem ser aplicados no mundo do futebol. A primeira é sobre a Lei geral da Copa.
Que a Copa vai afetar o cotidiano do País já era de se
esperar. As críticas costumam ser dirigidas às obras
realizadas nos estádios e pela superfaturação que parece
inevitável por essas bandas. Mas há outros reflexos mais
próximos da gente.
Já conhecia algumas críticas à Lei Geral da Copa. Além de
alguns pontos decididamente inconstitucionais – como a
criação de tribunais especiais – já existe reclamação sobre
as restrições severas ao comércio de rua no entorno dos
estádios (art. 11, LGC), à possibilidade de remarcação de
partidas e devolução dos ingressos em desacordo com o
Código de Defesa do Consumidor e o Estatuto do Torcedor
(art. 27, LGC), penalização de quem exibir publicamente as
partidas (ver jogo no boteco, nem pensar – art. 16, IV,
LGC), proibição dos sinalizadores (art. 28, VII, LGC).
O que é produtividade?
Fernanda de Negri explica que produtividade é um conceito
residual: trata-se de todo efeito sobre a produção que não
pode ser explicado olhando-se para o aumento do número de
trabalhadores (no caso do índice Produtividade do Trabalho)
ou de trabalhadores e máquinas (no da Produtividade Total
dos Fatores).
Simplificando, se uma empresa produz 100 sapatos em um
mês e no seguinte consegue produzir 200 sem comprar
novas máquinas nem contratar novos trabalhadores (ou pedir
que seus funcionários façam horas-extras), teve um ganho de
eficiência ou de "produtividade".
Pode ser porque os trabalhadores aprenderam a operar
melhor suas máquinas. Ou porque houve uma simplificação
burocrática no país em questão, que permitiu a empresa
reformular seu quadro de pessoal, aumentando a proporção
dos que trabalham diretamente na produção.
O fato de que vários fatores podem afetar a produtividade faz
com que também sejam muitas as teses sobre como
melhorar esse indicador.
Como se calcula produtividade
Há diversas formas de se calcular a produtividade de um
país. Para começar é preciso diferenciar a Produtividade do
Trabalho (PT) da Produtividade Total dos Fatores (PTF).
A primeira dá a medida da eficiência do trabalho. A segunda,
de todos os fatores de produção - o que inclui, além do
trabalho, os bens de capital (máquinas e equipamentos). Com
isso pode-se diferenciar, em um aumento de produção, o que
se deve a ganhos de eficiência e o que ocorre, por exemplo,
por causa da compra de uma máquina.
Em geral, a produtividade do trabalho é calculada dividindo-
se o PIB pela quantidade de pessoas ocupadas ou o total de
horas trabalhadas (o que contabiliza os efeitos das horas
extras). Já na PTF divide-se o PIB pelo resultado de uma
função matemática que pondera o estoque de capital e a
quantidade de trabalho.
Os empreendimentos que garantirão a realização da Copa do
Mundo no Brasil em 2014 também estão gerando impactos
sociais nas cidades-sedes do evento. Roberto
Morales desenvolve um levantamento para precisar quantas
famílias serão removidas e estima que mais de 3 mil pessoas
apenas no Rio de Janeiro estão sob ameaça. “Somente na
comunidade que vive na Vila Autódromo, na Barra da Tijuca,
mais de 350 famílias estão sob ameaça de remoção”, informa.
Segundo ele, ainda não existe um planejamento para a
realocação das famílias que serão removidas do local. “O
único planejamento que o governo faz é com base nos
recursos que irão entrar a partir da construção dessas obras.
(...) Inclusive o programa Minha Casa, Minha Vida, que no
Rio de Janeiro já é conhecido como Minha Casa, Minha
Remoção, é uma feira para tentar iludir os moradores com
uma residência à qual dificilmente eles terão acesso. Talvez
5% das famílias sejam beneficiadas com essas moradias”,
enfatiza em entrevista concedida por telefone à IHU On-Line.
Morales também destaca que os contratos assinados entre o
governo brasileiro e a FIFA limitarão o trabalho informal em
torno dos estádios, pois os vendedores ambulantes serão
proibidos de comercializar produtos num raio de dois
quilômetros dos estádios. “A população tem uma ilusão de
que vai lucrar com os eventos da Copa, mas na verdade será
brutalmente reprimida. A Copa será um grande negócio para
os empresários do esporte e para os representantes de
bebida e comida”, lamenta.
Roberto Morales é assessor do deputado estadual Marcelo
Freixo (PSOL) e organizador da plenária dos movimentos
sociais.
Confira a entrevista.
Como surgiu o Comitê Popular da Copa e quais são suas
principais ações?
Roberto Morales – O Comitê Popular foi criado durante a
Roberto Morales – O Comitê Popular foi criado durante a
realização do Panamericano, no Rio de Janeiro, quando, em
função das obras do evento, surgiram problemas de remoção
de diversas comunidades para a construção da Vila Olímpica
e das obras referentes ao evento. As comunidades
começaram a resistir às remoções e nós conseguimos reuni-
las, dando origem ao Comitê Popular. Começamos a
perceber que as remoções não eram o único problema dos
megaeventos. Vimos que havia outros fatores, como a
corrupção. As obras do Panamericano estavam orçadas em
300 milhões de reais, mas custaram 3,5 bilhões.
Este superfaturamento está se repetindo novamente numa
escala muito maior no Brasil e, especialmente, no Rio de
Janeiro, que também sediará as Olimpíadas.
Percebemos que tais eventos têm uma raiz mais profunda,
quer dizer, têm a ver com o modelo de desenvolvimento
econômico predador que reina no Brasil e, especialmente, no
Rio de Janeiro. Os grandes empreendimentos econômicos
também afetam populações e comunidades. Um caso
conhecido no Rio de Janeiro é o doThyssenkrupp, uma
indústria siderúrgica que está afetando no mínimo oito mil
pescadores que residem na região onde ela está instalada.
O Superporto do Açu, onde Eike Batista está construindo
um complexo siderúrgico, também ameaça destruir
assentamentos históricos do Movimento dos Sem Terra –
MST.
Em função da Copa do Mundo de 2014, quantas
famíliaserão removidas de suas casas? Como estão
sendo feitas essas remoções e como os moradores têm
reagido?
Roberto Morales – Estamos ainda fazendo um levantamento
para saber quantas famílias serão removidas, mas posso
dizer desde já que são muitas. Somente na comunidade que
vive na Vila Autódromo, na Barra da Tijuca, mais de 350
famílias estão sob ameaça de remoção. Ainda não temos um
número preciso, mas certamente serão mais de 3 mil pessoas
apenas no Rio de Janeiro.
Essas pessoas não serão removidas apenas por causa das
obras da Copa, mas também em função da construção e
duplicação de novas estradas. Todas as pessoas que moram
em beira de estradas há 40 ou 50 anos serão removidas e
isso irá gerar consequências gravíssimas, porque não implica
apenas na questão da moradia, uma vez que a construção de
novas moradias não acompanha o ritmo das remoções.
Também existe o problema do rompimento dos laços
históricos e culturais. Quando essas pessoas são removidas,
elas perdem as relações culturais e de amizade construídas
ao longo dessas décadas.
Como são planejadas as reestruturações urbanas e como
as remoções impactam no planejamento urbano das
cidades?
Roberto Morales – O único planejamento que o governo faz
é com base nos recursos que irão entrar a partir da
construção dessas obras. Portanto, não há preocupação com
as comunidades; elas estão sendo tratadas como descartáveis
e precisam ser retiradas para dar espaço aos turistas que
virão assistir aos jogos.
Inclusive o programa Minha Casa, Minha Vida, que no Rio
de Janeiro já é conhecido como Minha Casa, Minha
Remoção, é uma feira para tentar iludir os moradores com
uma residência à qual dificilmente eles terão acesso. Talvez
5% das famílias sejam beneficiadas com essas moradias.
Quais são os avanços do movimento social em relação à
resistência das remoções?
Roberto Morales – Esse movimento de resistência é
legitimo, mas é necessário que as comunidades comecem a
apresentar alternativas de moradia. Na Vila Autódromo, por
exemplo, já houve um avanço importante com a ajuda dos
companheiros do Instituto de Políticas Públicas Urbanas da
UFRJ, que disponibilizou um grupo de professores e
estagiários para trabalhar junto à comunidade e construir com
eles, em assembleia, um projeto alternativo de urbanização
da comunidade. Tudo isso a fim de que eles tenham
alternativas e não dependam de uma promessa vaga de
remoção.
No dia 18 de dezembro de 2011, os moradores da Vila
Autódromo apresentaram esse projeto, aprovado em
assembleia. Agora, eles vão “brigar” para implantá-lo e não
aceitar as remoções. Essa possibilidade de construir uma
alternativa popular junto com a universidade e com os
movimentos sociais me parece ser um salto de qualidade. Os
moradores estão entendendo esse processo e elaborando
várias propostas para levar esse modelo a outras
comunidades.
Além dos problemas de habitação, quais são os
principais impactos sociais das obras da Copa para as
cidades que cediarão os jogos?
Roberto Morales – Têm outros problemas que são relativos
ao trabalho. Por exemplo, com a Lei da Copa, fica
estabelecido que, por enquanto, num raio de 2 quilômetros de
onde estão sendo feitas as atividades esportivas serão
totalmente proibidas a venda de qualquer produto e a atuação
de qualquer comerciante que não esteja expressamente
autorizado pela FIFA. Isso quer dizer que a Federação
Internacional de Futebol Associado – FIFA tem mais
poder do que a própria Constituição Federal e as leis
trabalhistas do país. Então, a imensa população que é
desempregada, que vive do biscate e do trabalho informal
não poderá trabalhar durante esse período. Isso é terrível
porque a lei da FIFA passa por cima do direito básico do
cidadão: o direito ao trabalho. A população tem uma ilusão de
que vai lucrar com os eventos da Copa, mas na verdade será
brutalmente reprimida. A Copa será um grande negócio para
os empresários do esporte e para os representantes de
bebida e comida. Certamente os torcedores não encontrarão
aquele tradicional sanduíche nas proximidades dos estádios.
Outro problema é o encarecimento do custo de vida. O Rio de
Janeiro é a cidade que apresentou maior elevação no preço
dos aluguéis. Há uma especulação imobiliária brutal em
marcha, em função da entrada de muitos turistas no estado,
que compram em dólar e euro, com um padrão aquisitivo
muito maior do que o da população brasileira empobrecida.
Essa especulação imobiliária vai expulsar muitos moradores
de determinadas zonas da região por causa da
impossibilidade econômica.
De modo geral, qual a situação dos trabalhadores que
estão envolvidos com as obras da copa? Você visitou
algum canteiro de obra?
Roberto Morales – Alguns trabalhadores já organizaram
greves e a mais notória delas foi a do Maracanã. Eu estive
nos canteiros de obra, conversei com os operários. As
reivindicações deles são pertinentes porque desenvolvem
trabalhos temporários. Além disso, as condições de
alojamento são precárias, a assistência médica é descontada
do salário deles, há defasagem salarial e falta de segurança.
Eles relatam que as rotinas de trabalho são exaustivas,
porque a construção dessas obras é uma corrida contra o
tempo. Eles também enfrentam problemas com as
representações sindicais, que não são muito confiáveis. Mas
a força do movimento é tanta que, muitas vezes, eles
conseguem vitórias parciais. Essa mesma situação se repete
nos demais empreendimentos econômicos.
Qual foi a repercussão do dossiê que demonstra os
impactos e as violações de direitos, organizado pelo
Comitê Popular da Copa?
Roberto Morales – Entregamos o relatório e fizemos um ato
público no dia 12 de dezembro. O prefeito Eduardo Paes,
obviamente, não nos recebeu, mas conseguimos entregar o
documento para a secretária. Não temos nenhuma ilusão de
que ele irá tomar alguma atitude, porque ele tem uma posição
muito cínica em relação a essa questão. De todo modo,
encaminhamos o dossiê para outros organismos, como a
Assembleia Legislativa. Mas, no caso, os parlamentares estão
em recesso até fevereiro. Certamente o presidente da
Comissão dos Direitos Humanos,Marcelo Freixo, irá levantar
essa questão no plenário.
O que há de interessante e de equivocado na Lei Geral da
Copa?
Roberto Morales – A questão geral dessa lei é que ela se
sobrepõe à Carta Magna e isso é um disparate. Esta lei cria
uma área para ser governada pela FIFA e não pelo governo
brasileiro. As leis existentes, como a do meio ingresso, que
garante meio entrada para idosos acima de 60 anos, para
menores, estudantes, deficientes, será ignorada. Além do
mais, a FIFA irá estabelecer os preços dos ingressos de
acordo com os padrões do "primeiríssimo mundo" deles, o
que vai inviabilizar completamente a participação do povo nos
jogos.
Quais as implicações do uso de dinheiro público para a
realização desses megaeventos?
Roberto Morales – O Comitê da Copa não é contra a
realização deste evento, nem das Olimpíadas. No entanto,
eles não podem ser conduzidos da forma como estão sendo
feitos, pois o país tem outras prioridades. O Brasil está em
uma das piores posições relativas à educação em nível
mundial, por exemplo, e gastou 30 milhões de reais, somente
no sorteio das chaves eliminatórias para a Copa do Mundo,
realizado no Rio de Janeiro em 30 de junho. Enquanto isso o
salário do professor é 700 reais mensais.
Além de tudo, o país tem um déficit de moradia, por um lado,
mas investe na construção de estádios, por outro. Estádios
que depois serão abandonados. O transporte público é uma
desgraça; há engarrafamentos quilométricos e não se investe
em transporte público de massa. Em lugar disso, investe-se
em duplicação de estradas já existentes.
Deseja acrescentar algo?
Roberto Morales – O Comitê Popular da Copa não está
Roberto Morales – O Comitê Popular da Copa não está
desanimado. Estamos aprendendo com a própria experiência
a construir propostas alternativas de cunho popular. Estamos
pretendendo construir uma grande mobilização para junho
deste ano, quando será realizada a Rio+20. Enfim, o
movimento está começando a entender que unidade é
fundamental e que só dessa forma vamos poder fazer frente a
este projeto econômico capitalista.
A soberania do Estado Brasileiro foi jogada pra escanteio na proposta de Lei Geral da Copa. O projeto prevê a concessão automática de vistos de entrada e permissões de trabalho à FIFA, "a qualquer indivíduo que ela indicar", à equipe dos "parceiros comerciais da FIFA", qualquer pessoa com ingresso e outros. O país perde qualquer poder de controle quanto à entrada de estrangeiros em território nacional. Criam-se fronteiras internacionais dentro das nossas cidades, enquanto se dissolvem nossas fronteiras atendendo às exigências da FIFA. Assim, a FIFA se transformaria numa espécie de consulado geral e plenipotenciário do Brasil, por proposta de nosso governo, obrigado constitucionalmente a defender nossa soberania.
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